Boas Vindas!


Caros colegas,

sempre acreditei que uma sociedade bem informada e esclarecida acerca de seus direitos e deveres se tornaria imune a corrupções e "bandalheiras". Infelizmente, vivemos em um país lindo, porém cheio de adversidades dentre as quais a ignorânica é a que considero pior. Quando digo ignorância, me refiro à falta de conhecimento, de informação, elementos sem os quais nos tornamos vulneráveis. Por este motivo, resolvi criar este blog para compartilhar um pouco dos conhecimentos que venho adquirindo ao longo dos meus estudos e do meu trabalho como advogada. Sei que minha jornada será grande e que está apenas no início, por isso estarei aberta a novos conhecimentos também. Que este espaço seja utilizado para a troca de experiências e informações, visando o crescimento comum.
Como nem todos os textos são escritos por mim, gostaria de lembrar que o conteúdo é de responsabilidade dos respectivos autores e nem sempre representará minha opinião sobre o assunto.

Grande abraço a todos e sejam bem-vindos!


segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Lei Seca: a polêmica que não acaba!


Como dito em texto anterior, a polêmica em torno da Lei Seca está longe de acabar. Abaixo, reproduzo um texto do renomado jurista e professor Luiz Flávio Gomes acerca do tema. Embora não concorde com tudo o que o texto diz, ao final chego a conclusão de que todos queremos o mesmo fim, não obstante os meios sejam diferentes.


Embriaguez ao volante (art. 306 do CTB): um erro atrás do outro

Luiz Flávio Gomes*


Logo que entrou em vigor a Lei Seca (Lei 11.705/08 - clique aqui), que alterou a redação do art. 306 do CTB - clique aqui (que cuida do crime de embriaguez ao volante), escrevemos que o legislador tinha cometido erro crasso ao fazer o que não devia ter feito (ele passou a indevidamente exigir 0,6 decigramas de álcool por litro de sangue para a caracterização do crime) e não fazer o que devia ter feito (só exigir a embriaguez do condutor do veículo e a direção anormal: direção em zig-zag, por exemplo). Fez o que não devia e não fez o que devia (ter feito). Produziu um péssimo texto legislativo. Não mediu as consequências nefastas que geraria, sobretudo a impunidade de incontáveis motoristas.

Levantamento feito na Justiça estadual de todo país (entre junho de 2008 e maio de 2009) constatou que 80% dos motoristas que se recusaram a se submeter ao teste do bafômetro ou a fazer o exame de sangue para verificar a quantidade de álcool por litro de sangue acabaram sendo absolvidos (Folha de S. Paulo de 17/9/09, p. C7). A lei que veio para endurecer, em virtude da sua patente deficiência, está gerando impunidade. Por quê?

Porque só existem duas formas de se comprovar a quantidade de álcool no sangue: exame de sangue ou bafômetro. Aliás, o bafômetro (etilômetro), a rigor, não mede a quantidade de álcool no sangue, sim, ele mede a quantidade de álcool por litro de ar. Por força do Decreto 6.488 (clique aqui), que regulamentou o art. 306 do CTB, estabeleceu-se a equivalência. Seis decigramas por litro de sangue (exame de sangue) corresponde a três décimos de miligrama por litro de ar (exame pelo etilômetro ou bafômetro).

Ocorre que ambos exigem uma postura ativa do suspeito e ninguém é obrigado a fazer prova contra si mesmo (por força do princípio constitucional da não auto-incriminação), como vem sendo reconhecido pelo STF (HC 96.219/MG, RTJ 141/512, HC 68.742/DF).

Errou o legislador. E o grave problema é que os erros legislativos nunca ficam isolados. É um erro atrás do outro. O TJ/SC (Segunda Câmara, Ap. Criminal n. 3, Seara/SC), tentando corrigir o erro do legislador, passou a dispensar a prova da quantificação do álcool por litro de sangue. Ou seja: dispensou a comprovação de um requisito típico (algo inusitado em toda a história judiciária brasileira). Um erro crasso gerando outro erro crasso!

A AGU (Parecer de 20/7/09), no desespero de corrigir o texto legal, emitiu opinião no sentido de que a recusa ao exame do bafômetro gera o crime de desobediência (CP, art. 330 - clique aqui). Outro grave erro! Se a recusa ao bafômetro é um direito constitucional e internacional (por força da Convenção Americana de Direitos Humanos, art. 8º, que encontra amparo no art. 5º, § 2º, da CF - clique aqui), quem exerce um direito pratica ato lícito e quem pratica ato lícito não comete crime. Não há que se falar no delito de desobediência. Fez bem a PRF em ignorar esse Parecer, na sua instrução normativa 03/2009 (O Estado de S. Paulo de 16/9/09, p. C5).

Com o intuito (ainda) de corrigir o texto legal (ou seja: a redação equivocada do art. 306), a Câmara dos Deputados está, neste momento, discutindo novo texto legal, para endurecer a lei seca. Pela proposta, a recusa ao bafômetro passaria a ser indício suficiente para a prisão do suspeito. Outro grave erro! Quem exerce um direito não comete crime. E quem não comete crime não pode ser preso. Sempre que existe uma norma que autoriza uma determinada conduta, o que está autorizado por uma norma (no caso, internacional – art. 8º da CADH) não pode estar proibido por outra (nos termos da teoria da tipicidade conglobante de Zaffaroni e nos termos ainda da nossa teoria constitucionalista do delito, que sustenta a denominada tipicidade material).

Impressionante como um erro legislativo acaba gerando tantas polêmicas e tantos outros equívocos. Mas corrigir tudo é muito simples: é só aprovar nova redação para o art. 306 do CTB, exigindo tão-somente embriaguez ao volante e condução anormal (em zig-zag, por exemplo). É só isso e nada mais. Não há que se falar em taxa de alcoolemia (que é absurda porque cada pessoa reage de uma forma frente ao álcool). Cada um tem mais ou menos resistência ao álcool. Logo, o que importa é a embriaguez + direção anormal (que coloca em risco concreto a segurança viária). Faz-se urgente a atuação do legislador, mas no caminho correto.

*Diretor Presidente da Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes
 
Fonte: site Migalhas

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